Botos sofrem com impactos de hidrelétricas e mineração ilegal no Brasil

 

Monitoramento via satélite, entre 2017 e 2019, mostrou diferenças genéticas entre as espécies e a preferência por áreas de conservação. Mobilidade e oferta de alimentos são diretamente afetadas, aponta WWF-Brasil

Foto: Divulgação/WWF-Brasil
 

Monitoramento via satélite realizado por cinco organizações no período entre 2017 e 2019 identificou impactos das hidrelétricas e da mineração ilegal em espécies de botos que vivem em seis grandes bacias hidrográficas da Bolívia, Brasil, Colômbia e Peru. O estudo pioneiro analisou 29 cetáceos das espécies Inia geoffrensis, conhecidas como boto cor de rosa, e Inia boliviensis, ou bufeo boliviano. Os resultados deste trabalho fazem parte da Iniciativa Botos da América do Sul (SARDI, em inglês), que reúne pelas organizações Faunagua, Fundação Omacha, Instituto Mamirauá, Prodelphinus e WWF-Brasil.

Com o auxílio de pescadores e médicos veterinários, os pesquisadores instalaram pins (dispositivos com números de identificação pessoal) na parte dorsal dos cetáceos em áreas de águas rasas, onde a captura é mais fácil. O sinal emitido pelos botos foi capturado por satélite e, a partir dessas informações e da análise de material genético, a equipe identificou algumas evidências, como diferenças genéticas entre as espécies e a preferência por áreas de conservação.

“A pesquisa possibilitou que os golfinhos nos mostrassem quais são as áreas mais importantes para eles e quais podem ser destinadas para conservação”, diz Fernando Trujilho, diretor científico da Fundação Omacha e um dos principais especialistas em botos do mundo.

 

Ele destacou outro aspecto inédito da iniciativa, que consistiu em reunir profissionais de vários países em torno de metodologias de pesquisa e protocolos bem definidos. “O trabalho deve direcionar as políticas de preservação. Também pretendemos continuar as pesquisas nos rios Tocantins e Tapajós, onde estão previstas novas instalações hidrelétricas”, complementa.

Os pesquisadores registraram, ainda, que o tecido de todos os animais coletados apresentou alto teor de mercúrio, causada pela ingestão de peixe contaminado. O metal pesado é encontrado no solo amazônico (forma entrópica) e também utilizado na mineração ilegal, resultando também da queima, desmatamento e assoreamento. “É muito difícil dizer qual a origem. O fato é que  alguns animais têm dosagem de mercúrio muito alta os padrões humanos, e não sabemos nada sobre os efeitos dessa substância nos botos”, ressalta Oliveira.

De acordo com o pesquisador, o monitoramento revelou que as fronteiras geopolíticas são irrelevantes para os golfinhos. “Um animal se deslocou por 350 quilômetros da área de captura, evidenciando a conectividade dos rios”, exemplifica. Outro aspecto interessante é a preferência dos cetáceos pelas águas claras em vez das águas brancas, onde há maior concentração de peixes.

Apesar dos poucos recursos para a pesquisa científica, a iniciativa deve prosseguir com a captura de cinco animais na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no médio Solimões, com o objetivo de verificar se a proibição da pesca de piracatinga foi benéfica para os botos que vivem naquela área, já que a carne dos cetáceos é usada como isca para o peixe. Em 2014, uma portaria interministerial determinou a suspensão da pesca da piracatinga como medida para evitar a matança dos cetáceos.

“Somente quinze países no mundo têm botos. Na Ásia, as populações são muito ameaçadas. Aqui, eles apresentam condições de vida mais saudáveis, porém ainda são pouco conhecidos”, compara Oliveira.

Monitoramento

O SARDI promove a conservação dos botos e seus habitats com estratégias conjuntas, como monitoramento por satélite. Seu objetivo tem sido acessar informações científicas sobre essas espécies e seus habitats, seus movimentos, alimentos, o impacto de ameaças como a mineração e os efeitos negativos das mudanças climáticas, a fim de obter maiores insumos para sua conservação.

Assunto em Barcelona

Em dezembro, membros da SARDI devem participar de uma reunião em Barcelona onde serão traçadas estratégias para a retirada de golfinhos de áreas de hidrelétrica e transferi-los para unidades de conservação. “Ainda devemos acertas essa questão com o governo brasileiro e o Instituto  Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio)”, explica Trujilho.

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Bosco Cordeiro:
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