Mais do que Festa Junina, São João nordestino é expressão cultural e econômica
Mesmo com críticas de que estão perdendo características culturais, eventos pelos estados ainda encantam e se destacam como festas regionais
Festa Junina é uma das expressões culturais mais comuns no Brasil. De uma forma ou de outra, todo o País celebra o período junino, em uma festa que tem suas origens na religião.
Afinal, o São João é o mais lembrado no mês, ao lado de Santo Antônio e São Pedro. A origem da Festa Junina remonta a celebrações europeias que comemoram a chegada do verão, mas a festa mudou suas características ao chegar por aqui e acabou, no último século, fortemente associadas às áreas rurais brasileiras.
Ainda assim, pelo Brasilzão a fora a festa ganha cores, músicas e costumes distintos. A região Nordeste é responsável por algumas das principais celebrações e o São João de Campina Grande, na Paraíba, ao lado de Caruaru , em Pernambuco, são considerados os dois maiores do mundo.
Na região, o período costuma ser celebrado em família, unindo amigos mais próximos, fazendo uma fogueira e ouvindo forró. “Mês de junho pra nós do Nordeste é um mês de alegria, é a melhor época do ano”, celebra a potiguar Sandra Araújo. Todo ano a representante comercial reúne os amigos e faz uma excursão pelas principais festas da região, incluindo o Pingo da Meio Dia em Mossoró, no Rio Grande do Norte, além de Campina Grande e Caruaru .
O chamado “circuito junino” atrai quem é da região e gosta da celebração, mas também um grande número de turistas do Sudeste. De acordo com Rosália Lucas, Secretária de Desenvolvimento Econômico de Campina Grande, São Paulo é o segundo Estado que mais viaja para a cidade Paraibana em junho.
Porém nem sempre as festas foram um destino turístico. Campina Grande nasceu como “o maior São João do mundo” em 1983, mas seu início foi improvisado e não chegava nem perto da grandiosidade de hoje. A visibilidade do evento, porém, cresceu rapidamente e, em cinco anos já estava no calendário oficial de celebrações brasileiras. Com 36 anos de história em 2019, muita coisa mudou na festa.
A 120 km de distância, no interior pernambucano, a capital do forró disputa com Campina Grande o posto de “maior São João”. Caruaru tem pouco mais de 300 mil habitantes, mas durante o mês de junho a expectativa é que cerca de 1,5 milhão de pessoas passe pelo Pátio de Eventos Luiz Gonzaga e os mais de 20 polos ao redor.
O Pátio, com 41.500m², foi construído em 1994 para abrigar o crescente número de visitantes da área. Tamanho similar tem o Parque do Povo em Campina Grande, construído nos anos 1980 e com capacidade para 70 mil pessoas.
Com o espaço adequado e a fama crescente, os eventos juninos foram se popularizando a ponto de, não só se tornarem eventos famosos, mas impactarem na economia dos estados. De acordo com Rosália, em 2018 o evento injetou R$ 200 milhões na economia paraibana. O impacto foi tão grande que três redes hoteleiras decidiram inaugurar empreendimentos em Campina Grande . “O São João é um segundo Natal para o comércio, varejo e serviço. Vende mais que dezembro”, explica Rosália.
Em Petrolina, cidade a 712 km de distância de Recife, a festa deve render cerca de R$ 6 milhões, de acordo com a prefeitura. Caruaru deve gerar mais de 6 mil empregos diretos e no Ceará as festas do mês devem gerar R$ 130 milhões.
Dos nove estados da região, o que não faltam são opções de festa. Do bumba-meu-boi no Maranhão, passando por Parnaíba no Piauí, o Pingo da Meio Dia em Mossoró, até o Forró Caju em Sergipe, a região tem inúmeras opções para quem quiser conhecer a cultura local e gastar um dinheiro consumindo produtos.
Pop in Agreste
Campina Grande tem uma programação que vai de terça a domingo durante todo o mês. São quatro shows por noite no Parque do Povo, além de trios de forró espalhados por toda a região. Duas ilhas de forró atraem os turistas que estão caminhando para dançar e um coreto tem apresentações de violeiros.
Entre barracas e quiosques são 230 pontos comerciais, além de 180 ambulantes cadastrados, impactando em 3 mil empregos diretos e uma expectativa de 2,5 milhões de turistas no período de São João. Os números fazem do evento digno dos festivais de música internacionais e a estrutura cresce e se moderniza a cada ano.
Parte disso tem a ver com o potencial turístico, e parte com a iniciativa privada. Desde 2017, Campina Grande não recebe investimento majoritário da Prefeitura, mas sim com empresas do setor privado. Rosália vê com bons olhos essa mudança que, de acordo com ela, aumentou o potencial turístico.
De fato, a festa foi “estampada” em diversos aeroportos do país, como Guarulhos e Congonhas em São Paulo e Santos Dumont no Rio de Janeiro. Ainda de acordo com a secretária de Desenvolvimento Econômico, o modelo da festa é tão bem-sucedido, que outros estados estão interessados em replicar: “é um modelo muito exitoso”.
Para garantir o investimento e um número expressivo e crescente de turistas, porém, é preciso se reinventar. É comum que, entre os eventos do mês, encontre-se atrações como a maior quadrilha do mundo, o maior bolo de milho, o maior chocolate quente e assim por diante. Em Campina Grande, é realizado anualmente um casamento coletivo, enquanto Caruaru faz a Caminhada do Cuscuz.
Outra estratégia usada é diversificar as atrações. O forró ainda é o gênero musical mais consumido na região, mas atrair turistas de outras regiões significa apostar em atrações de outras regiões. Foi assim que cantores sertanejos começaram a penetrar nas festas juninas, o que não agradou a todos.
Em 2017, uma disputa se estabeleceu depois que Elba Ramalho se manifestou contra a forte presença de sertanejos no evento. Em resposta, Marília Mendonça avisou no palco que “ia ter sertanejo no São João sim”. Para as organizações, porém, a crise não foi adiante, já que ambas são atrações confirmadas tanto em Campina Grande como Caruaru.
Sandra concorda com os artistas da região, e acredita que os governantes valorizam nomes de fora. Ainda assim, ela pondera que há espaço para todo mundo, e quem não quiser acompanhar o show no palco principal ainda tem muitas atrações ao redor para aproveitar. “É o calor humano que faz a alegria”, acredita.
Grandioso e acolhedor
Mesmo com os mais de 40 mil m², quem chegar no parque do Povo vai dar de cara com uma “mini Campina Grande”. A cidade da Paraíba é recriada em todos os seus detalhes peculiares no evento, na decoração, nas ruas, na comida e no artesanato. Por isso, quem circular por lá vai se sentir em uma cidade de interior, de fato. “Quando você entra no Parque do Povo é familiar”, opina Sandra.
Ela fala que apesar da grandiosidade, o clima lembra aquelas festas de família, regadas a comida típica, cachaça e música regional. “Eu duvido passar numa barraquinha e não dançar um forró”, comenta aos risos.
Independente do tamanho, a Festa Junina do Nordeste é tão plural quanto a cultura na região. Economicamente é uma maneira de movimentar regiões que não são tão atraentes quanto as praias, e culturalmente permite ao resto do Brasil conhecer uma das mais bonitas e tradicionais festas que, pode até ter surgido na Europa, mas tem cara de Brasil.
Fonte: Gente – iG @ https://gente.ig.com.br/cultura/2019-06-16/mais-do-que-uma-festa-junina-sao-joao-nordestino-e-expressao-cultural.html?fbclid=IwAR0I2yTFxRGlI_yr91m_M4883DK-LKmU6Rj_uUH1rLngajoWjNCMJ-eAn7U