Retratando as ‘mães de fé’, Caprichoso completa sua segunda noite

 

O boi Caprichoso, sob o tema “No Braseiro da Fé, Esperança é Minha Luz”, fez uma apresentação com 2h23 de duração e trabalhou na diversidade dos credos

Foto: Jair Araújo

 

A resistência dos mais variados tipos de fé foi a aposta do boi Caprichoso para a segunda noite de apresentações no 54o Festival Folclórico de Parintins sob o tema “No Braseiro da Fé, Esperança é Minha Luz”. O bumbá azulado foi o primeiro a abrir as celebrações, entrando na arena às 20h e finalizando sua apresentação com 2h23 de duração.

O Caprichoso apresentou a fé como o caminho e o destino, das mais tradicionais como aquelas que estão presentes nos templos e terreiros, até as crenças populares e costumes místicos, independente de qual religião se ancore. Na abertura, a Marujada de Guerra surgiu segurando velas, enquanto a cantora Mara Lima surgiu na arena, ao lado de Davi Assayag e Prince do Boi, cantando a introdução da toada “Matriarca.

Na primeira alegoria, batizada de “Mátrias da Fé”, o Caprichoso levou para a arena quatro módulos, onde três deles representaram as “mães da fé” no Brasil: Nossa Senhora Aparecida, a mãe cristã reforçado pelos dogmas do catolicismo na época da escravidão no Brasil; Nhandecy, a “mãe terra”, responsável por zelar os quatro princípios sagrados da vida, que são a esperança, a ancestralidade, o respeito e a essência maternal.

E Iemanjá, orixá popular do panteão africano que, nas religiões de matriz afro é a “mãe de todas as cabeças”. A alegoria é assinada pelos artistas Adenilson Pimentel, Paulo Pimentel e equipe. O grupo folclórico trazia nas mãos pombos  brancos que batiam as asas. Loco após, surgiu um módulo trazendo uma moça gestante, simbolizando a maternidade.

Logo após, entraram na arena os membros do Maracatu Encanto do Pina. Davi Assayag cantou  a toada “Matriarca” enquanto a galera azul e branca levantava fotos de Nossa Senhora Aparecida. Hasteada por um gigante pombo branco que surgiu no meio das três mães de fé, veio a porta-estandarte Marcela Marialva, dançando ao som da toada “Pavilhão de Fé”.

Os caboclo-sacacas da floresta serão exaltados pela alegoria “O Sacaca da Floresta”, a terceira a entrar na arena do Bumbódromo. O caboclo sacaca é o curandeiro, cuja herança é o dom de curar, obtido pelos ancestrais, que geralmente foram grandes pajés. Aperfeiçoam seu dom junto à magia dos quilombos e em sessões xamânicas que acontecem nas aldeias.

Os médicos da floresta são especialistas em mandar para longe a energia negativa de espíritos de baixa vibração e em aliviar dores físicas. Costumam atender a população ribeirinha da floresta, que não tem dinheiro para investir em tratamentos de saúde tradicionais. A alegoria é assinada por Nei Meireles e equipe.

A alegoria trouxe consigo os grupos folclóricos simbolizando umbandistas e os orixás africanos, em uma analogia ao caboclo, que também se utilizam de folhas e ervas para curar . O módulo principal trazia a imagem de Jesus Cristo, representando a fé superior, cercado pela imagem de garças que suspendiam indígenas.

De dentro do módulo frontal, numa alegoria que retratava o rosto de um índio, saíram os três tuxauas ao som da toada “Dança dos Tuxauas”. No encerramento da apresentação, os carregadores dos tuxauas quebraram o protocolo e saíram de dentro de suas indumentárias, apresentando-se para os jurados.

A cabeça do índio se abriu, trazendo a mãe das águas, que revelou a sinhazinha da fazenda Valentina Cid, como quem estivesse trazendo a princesinha da fazenda do fundo dos rios. Logo após, as extremidades da alegoria se abriram, revelando uma cobra grande e um boto cor de rosa. A tinta azul neon fazia alusão ao fundo do rio. A superfície que trazia Valentina se desprendeu de sua base, revelando uma arraia, que levou a sinhá à arena.

Em outro ato, o presidente do Conselho de Artes do Caprichoso, Ericky Nakanome, fez a oração de São Jorge na arena, enquanto segurava uma imagem do santo nas mãos, onde também apresentou-a para os jurados. Em seguida, um módulo alegórico trouxe um dragão envolto em suas asas, representando o animal que foi derrotado por São Jorge nas batalhas. A vaqueirada, enquanto isso, bailava na arena.

As tribos indígenas entraram na arena ao som da toada “Réquiem”, de 96. Mais uma vez, o ex-levantador Arlindo Jr. fez uma participação especial no número, emocionando a todos. Depois, elas evoluíram com a ajuda do pajé Neto Simões na toada “Waia Toré”. A vestimenta do pajé, que veio sem a tradicional costeira, trouxe similaridade com a vestimenta do orixá Oxóssi, que é o guardião das matas e dos povos indígenas. Ele trajava um chapéu e uma saia de palhas e folhas.

A lenda das três princesas que, ao fugirem em alto mar para a África acabaram adentrando um portal místico e chegando à Aruanda – o mundo dos encantados – é a tônica da alegoria “As Princesas Turcas Encantadas da Amazônia”. Ao voltarem para a realidade, acabaram despertando na foz do Rio Amazonas.

A lenda das princesas turcas fez a arena incorporar a Turquia, exibindo camelos e bailarinas em trajes árabes. As três princesas foram trazidas numa embarcação que as levou para Aruanda. Ao retornarem de Aruanda, elas chegaram à Amazônia. Para simbolizar a chegada delas à região, uma oca se transformou em uma arara amarela, trazendo com ela a rainha do folclore, Cleise Simas.

Elas foram acolhidas por uma anciã, que, ao lamentar bastante a perda de seus parentes pela mão de homens brancos, acabou se transformando em pororoca e levando as três irmãs até o espírito Xaramudin, em Parintins. Uma delas, Erundina, foi transformada em guerreira indígena; Jarina ficou na corte de Dom Sebastião; enquanto Mariana se jogou nas águas. A alegoria é assinada pelo artista Márcio Gonçalves e equipe.

A quinta alegoria conta a lenda dos Caruanas, espíritos encantados de tom azul que vivem nas profundezas das águas, ajudando os pajés que os evocam a curarem pessoas. A alegoria “Caruana, A Fé Que Vem das Águas” é baseada na história de Zeneida Lima, uma curandeira paraense que fez uma viagem ao mundo sobrenatural das águas amarrada em teias mágicas, recebendo o dom da cura. A alegoria é assinada pelos artistas Estevão Gomes, Marlúcio Brandão e equipe.

A estrutura levou para a arena módulos de peixes que emergiam e mergulhavam em uma superfície. De dentro de um ovo, surgiu a cunhã-poranga Marciele Albuquerque, cuja costeira caiu acidentalmente durante sua chegada. Durante a toada “Marujada de Guerra”, o boi Caprichoso foi cumprimentar os jurados, enquanto cunhã, sinhá, rainha do folclore e porta-estandarte dançavam na arena.

A última alegoria do boi Caprichoso, chamada de “Kalankó – O Canto Para Jurema Sagrada” vai exibir o ritual “Toré Kalankó”, ritual indígena que passa a ser praticado também por afrodescendentes. Os cânticos possuem primordialidade no ritual, porque possuem a premissa de serem passados de geração para geração. No rito final, o pajé Neto Simões evoluiu na alegoria, saindo de dentro de uma onça, que fazia movimentos impressionantemente reais.

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